III Fórum do Interior: O interior do país não está condenado ao retrocesso
A terceira edição do Fórum do Interior decorreu nos dias 6 e 7 de Novembro, no Centro Cultural de Penacova. À semelhança das anteriores edições, largas dezenas de agentes do desenvolvimento local e rural e da economia social, académicos, autarcas, cooperativistas e outros interessados debateram e trocaram experiências, desta vez em torno da Cooperação e Desenvolvimento Local das regiões deprimidas e de baixa densidade, onde a necessidade da criação de uma Lei de Bases do Desenvolvimento Local encabeça o conjunto de conclusões saídas do III Fórum do Interior.
“Olhar primeiro para os nossos recursos e transformá-los em valor, é esta a prioridade quando falamos em desenvolvimento local” ao invés de estarmos de olhos postos no investimento externo – com estas palavras do Presidente da CM de Penamacor, Humberto Oliveira, na Sessão de Abertura, estava dado o mote dos trabalhos. Ideia retomada por Joaquim Felício, da CCDR Centro, ao centrar a sua intervenção na importância da “territorialização das políticas públicas” e na cooperação entre o local, o regional e o nacional, tendo por base as NUT’s. As políticas de cada um dos patamares não podem andar ao arrepio umas das outras. Preocupação que, referiu, informa a estratégia europeia vertida para o Portugal 2020.
Como se pode desenvolver o interior
A necessidade de um novo paradigma para as políticas de desenvolvimento foi defendida por Artur Rosa Pires, Professor Catedrático da Universidade de Aveiro, ao intervir na Conferência Inaugural sobre as “Condições para o Desenvolvimento das Regiões do Interior”, considerando estratégico perspectivar o desenvolvimento das áreas rurais tendo em vista integrá-las nas redes económicas globais, sob pena das regiões deprimidas e de baixa densidade estiolarem. E apontou algumas áreas por onde pode passar essa integração: o desenvolvimento de sistemas de alimentação saudável, dado que os tradicionais são agressivos para o meio ambiente; a revalorização da natureza, explorando as potencialidades do património e do meio ambiente, desenvolvendo e criando actividades várias; tornar mais eficiente o uso que fazemos dos recursos disponíveis, recorrendo mais intensivamente e de forma criadora à reciclagem de, por exemplo, resíduos da vinha, garrafas ou rolhas. Áreas em que as universidades podem desempenhar um papel fundamental se forem capazes de reorientar o seu foco do urbano para rural, que por elas tem sido negligenciado.
Artur Rosa Pires alertou ainda para alguns riscos, nomeadamente a perversão do conceito “inovação” por entidades institucionalmente poderosas, voltadas para o urbano e presas a abordagens tradicionais, o que, a acontecer, provocaria a uma marginalização ainda maior do rural que a aquela que actualmente existe; o olhar-se para o rural de forma nostálgica e com uma visão caritativa; a dificuldade em abrir as mentes das pessoas apegadas ao que sempre fizeram e que resistem em fazer diferente e a inovar e, por último, o verdadeiro labirinto que são as práticas de governança nesta matéria.
A centralidade da solidariedade horizontal
“A Importância da Economia Solidária para o desenvolvimento dos territórios” foi abordada por Pedro Hespanha, do Centro de Estudos Sociais da universidade de Coimbra. Começou por considerar que o conceito de Economia Social abriga uma grande diversidade de actividades em que predominam as relações de solidariedade ao invés do lucro. Relações com raízes antigas, que radicam na entreajuda rural, no cooperativismo e no mutualismo, no comércio justo e muitas outras práticas espalhadas pelo mundo. A este propósito referiu a importância dos estudos desenvolvidos pela Animar em 2011/2013 (Projecto ASAS - Aldeias Sustentáveis e Activas e À Descoberta do Mundo Rural) sobre a revitalização recente de algumas aldeias – e que, disse, mereciam maior difusão –, que mostram que o elemento decisivo dessa revitalização radica nas forças dessas comunidades e não nos recursos externos. Esses estudos chamam ainda a atenção para a importância das formas de solidariedade horizontal (alternativa à economia capitalista) face à solidariedade vertical (institucional, religiosa, filantrópica,…), por ser uma “solidariedade entre iguais”.
Algumas conclusões
Da mais de uma dezena de debates e oficinas realizadas resultaram um conjunto de conclusões sintetizadas na Sessão de Encerramento por Eduardo Figueira, Presidente da Animar. Considerou que este III Fórum cumpriu os seus objectivos, não obstante as dificuldades que enfrentam as organizações da Economia Social, e que estas mostraram a sua vitalidade e resiliência. E destacou em jeito de conclusão: a necessidade de se criar uma Lei de Bases do Desenvolvimento Local; que aquilo que está em curso não é um “regresso ao campo”, mas sim uma transição para um novo rural; que os fluxos migratórios a que assistimos podem propiciar vantagens; que a Economia Social é essencial ao desenvolvimento local e as suas organizações uma mais-valia para esse mesmo desenvolvimento; que é necessário e possível travar a sangria dos territórios do interior, bastando para isso que haja articulação estratégia entre o local e o nacional e a necessária vontade política; que, nesta perspectiva, o Programa Portugal 2020 constitui uma ferramenta facilitadora do papel das organizações da Economia Solidária como agentes capazes de contrariar os factores que levam ao aparecimento das regiões deprimidas, por possibilitar uma intervenção não caritativa; que é possível promover o desenvolvimento e a qualidade de vida nos territórios deprimidos e de baixa densidade desde que se adoptem as políticas adequadas, sendo o Portugal 2020 um instrumento adequado a esse fim.
Realizaram-se ainda as oficinas Sustentabilidade e Desenvolvimento nos Territórios do interior; Sectores Estratégicos da Economia na Vida das Populações do Interior; Cooperação Internacional e Desenvolvimento dos Territórios; Demografia e Migrações, e apresentada a iniciativa Portugal Inovação Social e o respectivo programa de financiamento.
Na noite de sexta-feira os presentes puderam ainda assistir à excelente prestação do Grupo Coral Divo Canto, de Penacova.
António Barata